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Geral Quinta-feira, 13 de Novembro de 2025, 15:47 - A | A

Quinta-feira, 13 de Novembro de 2025, 15h:47 - A | A

Há 50 anos, crise mundial do petróleo fez Brasil criar carro a álcool

Fonte: Agência Senado

Um passeio de carro que o senador Teotônio Vilela (Arena-AL) fez em Maceió em meados de 1976 foi tão fora do comum que o colega Arnon de Mello (Arena-AL) insistiu que ele compartilhasse a experiência com todo o Senado. A grande novidade foi combustível do veículo: o álcool.

— Um carro Corcel movido com álcool e água correu a uma velocidade de 80 quilômetros por hora sem que nada ocorresse de anormal ao motor — discursou Arnon. — O nobre senador Teotônio Vilela, nosso companheiro aqui presente, foi um dos passageiros nesse carro.

Teotônio confirmou que era mesmo verdade e disse que, se alguém quisesse comprovar, existiam filmagens feitas pela afiliada da TV Globo em Alagoas, que pertencia justamente a Arnon.

— Viajei ao lado do engenheiro, como um arriscado copiloto — relatou. — Andamos cerca de 40 quilômetros, subimos e descemos ladeira e chegamos a desenvolver, na verdade, 110 quilômetros por hora. Outros viajaram também. O carro rodou com absoluta tranquilidade, e o rendimento por quilômetro foi ótimo. Andar num carro em que se colocam álcool e água é, para mim, qualquer coisa de fantástico.

O senador destacou que, para não correr o risco de ser vítima de algum "embuste grosseiro", fez questão de examinar minuciosamente o combustível e o motor antes de entrar no Corcel.

O test drive em Maceió ocorreu nos primeiros momentos do Programa Nacional do Álcool (Proálcool), iniciativa lançada há 50 anos pelo governo federal com a meta de criar motores movidos a álcool. Àquela altura, os veículos do Brasil eram abastecidos apenas com gasolina ou diesel. No máximo, adicionava-se uma pequena dose de álcool à gasolina.

Assinado em 14 de novembro de 1975 pelo general Ernesto Geisel, o quarto presidente da ditadura militar, o decreto que lançou o Proálcool previu volumosas verbas públicas para instituições de pesquisa tecnológica, cultivadores de cana-de-açúcar e usinas produtoras de álcool. Os trabalhos foram coordenados por diversos ministérios, como o da Agricultura, o da Indústria e Comércio e o de Minas e Energia.

O programa foi exitoso e resultou numa tecnologia 100% brasileira, uma das mais importantes da história do país. Uma vez criado, o motor a álcool foi rapidamente adotado pela indústria de automóveis.

 
Fabricação do Fiat 147, o primeiro carro a álcool lançado no país (DIvulgação/Stellantis)
 

Os discursos de Teotônio Vilela e Arnon de Mello estão entre os documentos da época  guardados hoje no Arquivo do Senado, em Brasília, que ajudam a reconstituir a trajetória do histórico programa.

Numa audiência pública no Senado, o secretário de Tecnologia Industrial do Ministério da Indústria e do Comércio e um dos idealizadores do Proálcool, José Walter Bautista Vidal, apresentou o projeto aos parlamentares:

— Estabeleceu o ministério um programa de estudos visando à viabilização técnica e econômica de alternativas energéticas nacionais, com ênfase em combustíveis líquidos a serem obtidos de fontes renováveis que venham a se constituir em sucedâneo para os combustíveis fósseis. A identificação do álcool etílico, o etanol, como opção prioritária resultou clara, inquestionável.

O que motivou a busca foi o primeiro choque mundial do petróleo. Em 1973, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) decidiu reduzir a extração e aumentar o preço. Os países que quisessem uma parte do escasso petróleo disponível teriam que pagar caro por ele. O preço barril explodiu, passando de US$ 3,50 para US$ 13 em apenas um ano.

Foi uma estratégia geopolítica. Os países árabes da Opep tomaram a medida como forma de pressionar as potências ocidentais, dependentes do petróleo do Oriente Médio, em especial os Estados Unidos, a retirar o apoio militar dado a Israel na Guerra do Yom Kippur, contra o Egito e a Síria.

Como boa parte do planeta, o Brasil se viu em apuros. Uma preocupação do governo foi com a disponibilidade e o preço da gasolina, um dos subprodutos do petróleo. De todo o óleo bruto consumido pelo país, 70% vinham do exterior. Apenas 30% eram extraídos no território nacional.

Outra preocupação foi com a balança comercial, que se desequilibrou de forma drástica, uma vez que o gasto com as importações ficou progressivamente mais alto do que o ganho com as exportações, gerando prejuízos nas contas externas.

 
Propaganda de TV produzida pelo governo em 1979 apresenta o Proálcool aos brasileiros e pede que economizem gasolina (Arquivo Nacional)

A ditadura reagiu recorrendo a três estratégias para diminuir a necessidade de compra do petróleo estrangeiro. A primeira delas, que provocou uma grande insatisfação popular, foi forçar os brasileiros a consumirem menos gasolina.

Para isso, elevou o preço do combustível, proibiu que os postos funcionassem nos fins de semana, limitou a velocidade máxima nas rodovias a 80 quilômetros por hora e veiculou campanhas educativas na televisão incentivando a carona solidária e o uso do ônibus no lugar do carro.

A segunda estratégia foi prospectar novas reservas de petróleo no território nacional. A última, por fim, foi buscar algum substituto para essa matéria-prima importada. Foi então que se pensou no álcool.

— O álcool poderá ser produzido bem mais rapidamente do que a descoberta de jazidas petrolíferas — prognosticou o senador João Cleofas (Arena-PE).

— Bendita crise do petróleo, que nos despertou para os problemas nacionais — afirmou o secretário do Ministério da Indústria e do Comércio naquela audiência no Senado. — Que devemos procurar petróleo, não há dúvida. Mas, por mais gigantescas que sejam as nossas reservas desconhecidas, elas são finitas, acabam um dia. O álcool não, é eterno, perdurará enquanto existir o Sol.

— O álcool não é outra coisa que energia solar líquida — explicou Teotônio Vilela. — E nós temos um território excepcionalmente escolhido para o álcool, o que vai redimir o Senhor Deus de não nos ter concedido o petróleo há 20 milhões de anos.

Proprietário de canaviais e produtor de açúcar e álcool em seu estado, o parlamentar alagoano foi um dos maiores entusiastas do promissor combustível no Senado.

 
Publicidade veiculada na imprensa no início dos anos 1980 promove carros movidos a álcool (Biblioteca Nacional Digital)
 

Entre as diversas razões que tornavam o Brasil vocacionado para o álcool, os senadores apontaram a grande extensão territorial, o clima tropical e a sólida tradição de plantar cana-de-açúcar, que vinha desde os tempos em que era uma colônia portuguesa.

Ainda de acordo com os documentos do Arquivo do Senado, eles também enumeraram os vários benefícios que os carros a álcool trariam ao país. Além de ajudar a minimizar os problemas da falta de petróleo e da balança comercial desfavorável, o novo combustível dinamizaria a agricultura e diferentes ramos da indústria, geraria empregos e frearia a fuga de trabalhadores do campo para a cidade.

Tomando mais uma vez a palavra, Teotônio Vilela acrescentou à lista de benefícios a redução da poluição do ar nas metrópoles.

— Imaginemos que chegue alguém de Marte ao Brasil e pergunte por que não utilizamos o álcool, mas só a gasolina, e se é só uma determinação nossa de acabar com a vida humana. Isso porque, enquanto a gasolina é poluente, produz milhões de doenças urbanas, o álcool é antisséptico, o seu escape não produz nenhum elemento que provoque intoxicação. É um combustível limpo, saudável. Então, nesta minha ficção, o homem vindo de Marte haveria de perguntar se nossa vocação era mais para o setor de suínos ou realmente para o setor de humanos — disse ele, rindo da própria piada.

Na época, a emissão de dióxido de carbono preocupava apenas por causa dos efeitos sobre a saúde humana. Ainda não estava cristalizado o entendimento científico de que a emissão de certos gases é responsável pelas mudanças climáticas.

Nos debates em torno do Proálcool, o senador Luís Cavalcante (Arena-AL) se disse preocupado com a possibilidade de o governo acabar criando uma "Alcoolbrás", isto é, uma burocrática e pesada empresa estatal detentora do monopólio do álcool brasileiro.

Apoiando o colega, o senador Roberto Saturnino (MDB-RJ) afirmou que uma eventual estatização da produção do álcool seria "absolutamente condenável":

— Não vejo razão para a intervenção direta do Estado. Não há nenhuma exigência em termos de tecnologia e capital que a impeça a exploração desse campo pela iniciativa privada. O papel do governo seria apenas o de padronizar a composição química do álcool.

 
Marchinha carnavalesca sobre o Proálcool é submetida pelo autor, em 1979, ao Serviço de Censura Federal, que liberou a música (Arquivo Nacional)
 

A ideia do álcool como combustível não caiu do céu nem surgiu em 1975. O Brasil já havia feito experimentos. Teotônio lembrou que, em 1923, o engenheiro Heraldo de Souza Matos, numa prova automobilística no Rio de Janeiro, "correu com um carro Ford alimentado exclusivamente com aguardente". Esta última palavra arrancou risadas dos senadores.

Embora a "aguardente" não tenha vingado, o experimento serviu para que o governo enxergasse o potencial do álcool e determinasse a adição de pequenas porcentagens à gasolina vendida no país, para que ela rendesse mais. Medidas do tipo foram tomadas especialmente em períodos de crise internacional, como a quebra da Bolsa de Nova York (1929) e a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que fizeram o petróleo quase sumir do mercado internacional.

Para argumentar que o álcool tão almejado pelo Brasil era, sim, viável, Teotônio Vilela recorreu às memórias de sua juventude e citou aquele que pode ter sido o pioneiro dos combustíveis nacionais:

— Durante a Segunda Guerra, em Alagoas, a Usina Serra Grande produziu um combustível que denominou "usga", vendido nas bombas de Pernambuco, Alagoas e Sergipe. Era álcool puro. A usina teve apenas que usar um estratagema para evitar o consumo humano: colocou um ingrediente, mudou a cor e o nome e disse que era veneno. Eu era jovem na época, mas me recordo muitíssimo bem. E desse combustível nos utilizamos em caminhão e automóvel. Todo o tráfego naquela região foi feito com a "usga".

 
Anúncio comercial do Grupo Matarazzo, que produziu álcool combustível no início dos anos 1980 (Biblioteca Nacional Digital)
 

Quando o Proálcool foi lançado, uma das apostas era que o combustível fosse produzido não apenas da cana-de-açúcar, mas também da mandioca. Essa matéria-prima aparece, inclusive, no decreto de criação do programa.

— O Brasil tem uma tradição na obtenção do álcool a partir da cana-de-açúcar e agora tenta obtê-lo através da mandioca. Alguns especialistas admitem que, por hectare, teríamos 2,1 mil litros através da mandioca e 3,1 mil litros através da cana — observou o senador Itamar Franco (MDB-MG), apontando o potencial do tubérculo.

— Importante para o Brasil e para a Bahia, o meu estado, será o rápido incremento da implantação de usinas para a produção do álcool extraído da mandioca, de modo a gradativamente ganharmos fontes de energia que possam até nos libertar da importação de petróleo. Hoje isso não é uma utopia, mas uma palpável realidade conquistada pela tecnologia — comemorou o senador Luís Viana (Arena-BA).

— A ênfase maior está sendo dada à produção de álcool extraído da cana, quando o tratamento preferencial deveria ser destinado à mandioca. O álcool da cana pode prejudicar a produção de açúcar, que é uma excelente fonte de divisas para o país — opinou o senador João Calmon (Arena-ES).

— Tivemos a notícia, que nos desagradou, de que, ao se dizer que a mandioca é boa para álcool, isso ocasionou um aumento no preço da mandioca, que é produto de subsistência das regiões pobres do país — criticou Bautista Vidal, o secretário do Ministério da Indústria e do Comércio, na audiência no Senado. — Esse entusiasmo de que a mandioca vai servir para álcool precisa ser qualificado. Não é a plantação de fundo de quintal, que abastece as populações pobres, que servirá como matéria-prima. São necessários empreendimentos de porte.

— Perdoem-me dizer isto, mas sou também produtor de álcool e desde muito moço sei que se fabrica álcool tanto da cana-de-açúcar quanto da batata-doce, da mandioca, do milho, do sorgo. Então eu fico assombrado com os jornais a noticiar sobre o álcool dizendo: é de mandioca, é de cana-de-açúcar etc. Parece até uma torcida entre Flamengo e Fluminense. E o problema essencial, que é produzir álcool, não chega nunca — criticou Teotônio Vilela.

Outra opção cogitada foi o babaçu, fruto da palmeira de mesmo nome, comum nas regiões Norte e Nordeste. Segundo um relatório do governo apresentado no Senado em 1980, das 303 usinas aprovadas desde 1976 para receber dinheiro do Proálcool, somente 12 usariam a mandioca e uma única, o babaçu — a grande maioria processaria a cana-de-açúcar.

No fim das contas, os planos de que os postos de combustível oferecessem álcool de mandioca e babaçu foram frustrados. Concluiu-se que as duas alternativas eram comercialmente inviáveis, já que — ao contrário da cana-de-açúcar — não podiam ser cultivadas em larga escala nem dispunham de uma estrutura de produção profissional e consolidada.

 
Nota do jornal Tribuna da Imprensa trata em 1978 do combustível feito de mandioca, como parte do Proálcool (Biblioteca Nacional Digital)
 

Quando afirmou que o prometido álcool não chegava nunca, Teotônio não exagerou. Aquele carro que o senador testou em 1976, em Alagoas, não vingou. Diferentes protótipos apareceriam ao longo dos anos seguintes.

— Não entendo por que razão não se cuida do álcool. O presidente da República quer, todo mundo quer, mas não se faz. É como a democracia — queixou-se ele, referindo-se de forma jocosa à abertura política do Brasil planejada pelo general Geisel, que parecia não avançar.

No entender do senador Roberto Saturnino (MDB-RJ), o Proálcool demorava para deslanchar porque vinha sendo sabotado por gente da própria ditadura:

— Quando o governo lançou o programa, é fato notório que grande parte das autoridades do governo duvidava. O ministro das Minas e Energia dizia abertamente que álcool era coisa para indústria química, nunca para energia. O ministro da Fazenda não perdia uma oportunidade para um chiste, para ridicularizar o Programa do Álcool. O ministro do Planejamento, igualmente. E, com isso, as autoridades iam sabotando o que a Comissão do Álcool aprovava, e os projetos não recebiam os financiamentos do Banco do Brasil.

Os parlamentares governistas, por sua vez, diziam que a nova tecnologia logo surgiria porque Geisel estava pessoalmente empenhado. Eles lembravam que o militar tinha profundo conhecimento do mundo dos combustíveis por já ter presidido a estatal Petrobras.

A partir do lançamento do Proálcool, foram necessários quase quatro anos até que finalmente a tecnologia estivesse desenvolvida e a indústria automobilística lançasse os carros com os novos motores.

O primeiro modelo movido exclusivamente a álcool foi o Fiat 147, e sua produção começou em julho de 1979, logo após o segundo choque mundial do petróleo. Para marcar o feito, o general João Figueiredo, o quinto e último presidente da ditadura militar, fez um test drive daquele carro inovador.

Como se tratava de uma grande novidade, os jornais explicaram aos leitores que o álcool seria oferecido em bombas de combustível idênticas às da gasolina. Nelas foram afixados cartazes advertindo que aquele álcool não poderia ser misturado à gasolina nem usado em motores não adaptados à tecnologia.

 
Volkswagen testa modelos experimentais de Brasília e Kombi movidas a álcool (Divugalção/Volkswagen)
 

Os senadores procuraram dar a sua contribuição para que os carros a álcool caíssem no gosto popular. Eles apresentaram projetos de lei para, por exemplo, isentá-los do pagamento anual da Taxa Rodoviária Única, reduzir em 50% o Imposto sobre Produtos Industrializados incidente neles e garantir a taxistas e condutores de lotação e transporte escolar e outros motoristas autônomos um abatimento de pelo menos 20% no combustível comprado via cooperativas e sindicatos.

Também estudaram propostas para proibir a fabricação de veículos a gasolina com potência superior a 180 cavalos (os mais potentes teriam que ser movidos a álcool) e até obrigar as corridas esportivas nacionais a utilizar exclusivamente carros equipados com a nova tecnologia.

Nenhum dos projetos foi aprovado. Mesmo assim, o álcool ganhou o Brasil com rapidez. Em 1980, um ano após o lançamento do primeiro carro, o senador Bernardino Viana (PDS-PI), apresentou os resultados positivos e as boas perspectivas:

— Os produtores de veículos automotores acreditam que não vai faltar álcool carburante e alardeiam que um quarto dos carros vendidos neste ano, isto é, 250 mil, são movidos a álcool. A Volkswagen prevê que 80% de sua produção no próximo ano, estimada em 550 mil unidades, será de carros a álcool.

O slogan usado na época pela empresa de açúcar e álcool Copersucar se confirmava: "Carro a álcool: você ainda vai ter um".

Motoristas que desejavam abandonar a gasolina, mas não podiam comprar um carro novo, recorreram à adaptação dos motores para o uso de álcool — uma metamorfose realizada nas oficinas mecânicas. O Senado chegou a estudar um projeto de lei que autorizava a Caixa Econômica Federal a conceder empréstimos com boas condições àqueles que desejassem converter seus carros.

 
Projeto de lei apresentado pelo senador Gastão Müller em 1982 incentiva a produção de carros a álcool (Arquivo Senado)
 

Os carros a álcool foram de vento em popa até 1989, quando faltou o combustível no mercado, dando origem a uma crise nacional. Isso ocorreu porque o preço internacional do açúcar disparou, o que motivou as usinas a priorizar esse produto em detrimento do álcool. Para tentar contornar o problema, o governo liberou a importação de metanol, uma substância tóxica, para ser misturada ao álcool e à gasolina.

Com a crise econômica, os brasileiros passaram a evitar os carros movidos a álcool, e a década de 1990 ficou marcada pela volta em massa à gasolina. Um dos símbolos do governo do presidente Itamar Franco foi o relançamento do Fusca, em 1993 — os chamados "Fuscas do Itamar", movidos a álcool, representavam uma tentativa de reaquecer esse mercado. Como senador na época do Proálcool, Itamar havia feito diversos pronunciamentos em defesa do combustível alternativo.

A virada para valer, contudo, só ocorreria em 2003. O álcool voltou a ser usado em grandes proporções quando a Volkswagen pôs no mercado o primeiro modelo flex do Gol. A tecnologia flex, também 100% brasileira, permite que o mesmo veículo seja movido a álcool, a gasolina e à mistura dos dois em qualquer proporção.

As repercussões do Proálcool são sentidas até os dias de hoje. Nada menos que 85% dos carros que atualmente circulam no Brasil são flex. A mais nova aposta do mercado são os veículos híbridos flex, movidos tanto a álcool e gasolina quanto a eletricidade.

A cana-de-açúcar já não reina absoluta no mercado. Atualmente, perto de 25% do álcool produzido no país é derivado do milho. Essa tecnologia, no entanto, é norte-americana, e não brasileira.

No fim de 2009, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) baixou uma resolução que obrigou todos os postos de combustível a trocar o nome "álcool" por "etanol" nas bombas e nos painéis com os preços, padronizando o nome em termos técnicos.

 
O governador de Minas Gerais, Francelino Pereira, e o presidente da Fiat, Miguel Augusto Gonçalves, em lançamento de carro movido a álcool (DIvulgação/Stellantis)
 

De acordo com o economista Pedro Ramos, professor aposentado da Universidade de Campinas (Unicamp), olhando em retrospectiva, é possível encontrar falhas no Programa Nacional do Álcool:

— O Proálcool se limitou a beneficiar os interesses econômicos do complexo agroindustrial canavieiro. Dessa forma, ajudou a concentrar terra e renda. Foi a principal causa da expansão da cana no estado de São Paulo, que levou à superexploração dos boias-frias e até mesmo à morte de alguns desses trabalhadores. A preocupação foi com os ricos, não com a classe mais baixa. Isso não chega a ser surpreendente, já que a ditadura militar não tinha nenhuma preocupação social.

Por sua vez, o engenheiro agrícola Luis Agusto Cortez, também professor da Unicamp, prefere ressaltar os impactos positivos:

— Além de reduzir a dependência de petróleo do país, o Proálcool criou muitos empregos, contribuiu com a redução das emissões brasileiras de gases do efeito estufa e ensinou o país a fazer agricultura de larga escala. Se hoje temos um setor chamado agronegócio e a soja como sustentáculo da economia, isso se deve ao aprendizado trazido por aquelas plantações de cana. Em outras palavras, o Proálcool foi importante tanto para nossa segurança energética quanto para a nossa segurança alimentar.

Outro impacto se vê no preço dos combustíveis, segundo ele. Além de o álcool custar menos do que a gasolina, a própria gasolina ficou mais barata por causa do álcool que passou a ser adicionado. Se não fosse essa adição, a gasolina custaria o dobro do que custa hoje.

 
Publicidade de 1979 promove carro da Fiat movido a álcool (Biblioteca Nacional Digital)
 

Cortez defende que os brasileiros conheçam a história iniciada há 50 anos e, consequentemente, passem a ter orgulho do Proálcool:

— O álcool mostra que nós também somos capazes de grandes realizações. Criamos um exitoso programa de energia renovável sozinhos, sem a ajuda de ninguém. Não precisamos, portanto, sofrer daquele complexo de vira-lata que nos faz sentir menores diante de outros países. Quando enfim tomarmos consciência do nosso potencial, certamente vamos fazer inúmeras outras descobertas tão importantes quanto o álcool.

Fonte: Agência Senado

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